18 fevereiro 2008

Um Conto a Quatro Mãos (VI)

__A ânsia pelo arfar cessou ao encarar aquela situação. O arauto do que ele não concebia estava ali, com as unhas quebradas e sujas. Mas o que recomeçou o fluxo ensandecido de acontecimentos foi o sumiço daquela absoluta absurda alucinação. Um riso cristalino rasgou o silêncio resguardado pelo zumbido das sebes transpostas.
'Olhe, olhe quem vem lá
Correndo feito o Coelho que sempre atrasado está'

__Com o ar divertido, um homem muito elegante entrou em seu campo de visão. Vestia um terno preto assaz ajustado, portando luvas mais claras que sua tez e uma bengala preta com detalhes em prateado. Uma cartola preta encimava seu cabelo ondulado acastanhado inconformado, e olhos sagazes sorriam maliciosos sobre seu nariz afilado. Era de uma estranha fisionomia andrógena, e sua voz não denunciava seu sexo. Pairava na indecisão, na suave curvilínea glabra do rosto fino, inquietante π dentre números inteiros.
'Há tempos te espero, jovem amigo,
Chame-me de Anfitrião e venha comigo
Ao meu incomum e confortável abrigo'
__O(a) Anfitrião estendeu-lhe a mão coberta de fino pano e aguardou que o moço, o pobre esfarrapado e ensangüentado moço se aproximasse.
'Em um lugar subterrâneo há uma singela morada
para minha pequena coleção
- embaixo de uma casa, escondida por cerca eletricamente farpada -
têm fetiche, fobia, estranheza. Transtornados todos são'
__Com um aperto enérgico ele agarrou o antebraço do hesitante moço e a um movimento veloz executado pela bengala, abriu um rasgo no ar e pulou dentro dele. O moço perdeu o equilíbrio e bateu a testa num muro de concreto, sentindo um líquido quente escorrer por entre suas linhas de expressão.

Um comentário:

Tuma disse...

http://amortescimento.blogspot.com/2008/02/um-conto-de-duas-pessoas-vii.html

Uhul!